sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Face errada da noite

A noite caía em nós, escondida nas nuvens, escondida do tempo. E hoje fomos três, quase como se um apenas, no cimo daquele telhado, um tanto mais longe de tudo. Ali nos deitamos, três umbigos virados para o espaço, à procura do norte. Ela, com as incertezas presas nos caracóis, pestanas húmidas e coração trémulo – perdida novamente. Ele, no meio, mãos atrás da cabeça e pernas cruzadas, clamando em surdina um sinal qualquer que o fizesse perceber aquele turbilhão de emoções das duas amigas, e por ter cortado demais o cabelo e parecer um “nabo”. Eu, olhos postos na única estrela que se via, procurava no meu peito um motivo forte para ter deixado o meu coração ir daquela maneira, se ter perdido daquela maneira, enquanto sussurrava “It started out with a kiss,had love, how did it end up like this?”... enquanto fechava os meus olhos com força procurando afastar a minha imaginação de trilhos indesejáveis para não me perder.
O ar ensaiava o peso daqueles corpos cheios de sei-lá-o-quê, quase colados ao céu. (acho que são saudades de um dia parecido na ribeirinha).
No fim da noite éramos as duas amigas de sempre, falávamos de medos, de dias felizes, do silêncio; falávamos em silêncio quase e as palavras iam ficando no ar e iam se entranhando devagarinho... Sei lá quanto tempo ali ficamos, com o lado mais escuro à vista da noite. Sei lá quantas imagens e ideias foram ali arrancadas aos poucos para doer menos. Sei lá quantas maldições lançamos aos céus por às vezes nos darem semelhante nó no peito que quase não conseguimos respirar. Sei lá das tolices tão cheias de razão que partilhamos.
Ela explodiu em lágrimas de coração confuso e Ele em meias-palavras manda a foto do “nabo”, Eu hoje queria vos segurar aos dois num abraço muito forte, porque não há trilho indesejável que eu não ultrapasse tendo-vos ali, minhas pessoas que são. O vento levou as nuvens e um bocadinho do peso que ali se instalara e apesar da bússola ainda não estar arranjada, o norte já se fazia sentir algures pelos nossos lados. Saltamos do telhado e eu armada em corajosa saltei sozinha,( porque como ele diz “tu és sempre assim, tudo sozinha e como tu queres…”), como quando era miúda, só para provar a mim mesma que era capaz, que ainda sou forte e corajosa para dar um salto no desconhecido de vez em quando. Bem feito! (que) fiquei com os pés doridos porque o chão nunca mais chegava, mas foi tal o aperto na barriga que só me deu foi vontade de rir, com os olhos feitos em lágrimas. Fosse sempre assim...
Ela olhou para mim e sorriu-me, quase com medo do que se passaria ali dentro de si outra vez, e com receio de eu andar a rever aqueles assuntos que não devem ser remexidos, mas nós somos daquelas que remexem em feridas que pensam já saradas, mas que abrem com qualquer toquezinho, seja por velhas fotos que lembram momentos, com hora e data estipulada, como momentos únicos de uma vida. E eles foram os dois, cada um para seu lado. E eu fiquei a ouvir aquela música, que me fala de ti, e que te faz partir. Música que me leva os medos e me leva a ânsia por algo que eu sei que está para voltar em breve. E por dentro dancei, dancei, dancei e cantei a plenos pulmões "Oooh, you set my soul a-light!" quase como se aquele sufoco saísse de dentro pelos dedos que desenhavam no ar amarguras quase ridículas e que rompiam na voz cansada e agitada ao mesmo tempo: "Oh baby, don't you know I suffer? (...) How long before you let me go? "
E foi tudo de uma tal maneira que nem parecia real. Sei lá eu o que nos faz sentir tanto estas coisas que parece que nos remexem nas entranhas mais profundas. Sei lá eu como lidar com isto. Sei lá! Ela diz que somos ridículos porque nos damos sempre tanto que nos tornamos incrivelmente vulneráveis, subimos as escadas até bem lá acima só pelo prazer que nos dá o caminho e já com a certeza que o pé nos há-de fugir a certa altura e nos vamos estatelar todos no chão, mas mesmo assim, ridículos que somos, fazemo-lo, por vezes e vezes sem conta nos vermos no meio do chão, a chorar baba e ranho, à espera de uma oportunidade para recomeçar e voltar a subir, para voltar a cair. Ela diz que há-de ser sempre assim, que é assim que funciona. Eu, ainda gosto de acreditar que não, e gosto de lhe fazer ver a ela, como já fiz a ele em tempos, que não faz mal ir vendo, ir dando devagarinho, ir subindo, que estas quedas servem mais é para aprender. O degrau onde já tropeçamos os três não pisaremos mais e pelo menos esse não nos fará cair de novo...
Amigos «3

2 comentários:

  1. Em cada recanto desta cidade,e de outra bem lá no norte guardamos segredos, meus, teus,nossos...guardamos sorrisos, gargalhadas,piadas,desvaneios,loucuras, mas também guardamos aquela lagrima q surge sempre na despedida, na distancia,mas tambem na saudade!
    Pode passar o tempo q passar q fica sempre aquela nostalgia de qdo "estes 3 se juntam"...somos tao parecidos,mas com historias cmpletamente opostas, somos tao amigos, mas com uma distancia enorme a nos separar!...
    Esta nostalgia não sei se é boa ou má,mas deixar a certeza do q foi vivido ate aí trás saudades,e muitas!

    Beijinho*

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  2. Li e vou reler...adorei!!!


    Um beijinho
    Eduarda
    be in ♥ love

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